quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Astronautas fazem treinamento no Havaí para missão a Marte


(The New York Times/Folha) A caminho de Marte, Neil Scheibelhut parou numa loja para comprar enxaguante bucal e fio dental. "Estamos pegando algumas coisas de última hora", disse ele por celular.

Scheibelhut não é realmente um astronauta partindo da Terra. Mas, três horas depois, ele e outras cinco pessoas entraram num edifício em forma de cúpula, construído sobre um vulcão havaiano, onde viverão por oito meses, imitando uma estadia na superfície marciana.

Isso é parte de um estudo financiado pela Nasa, a agência espacial dos EUA. O objetivo do projeto Hi-Seas (Análogo e Simulação de Exploração Espacial do Havaí, na sigla em inglês) é examinar como as pessoas, isoladas da civilização, podem conviver e cooperar.

Quando os astronautas partirem para Marte, dentro de vários anos -a Nasa programa a missão para 2030-, será uma viagem longa e solitária: cerca de seis meses até Marte, 500 dias no planeta e depois seis meses no regresso para casa.

"Neste momento, os riscos psicológicos ainda não estão completamente esclarecidos", disse Kimberly Binsted, da Universidade do Havaí em Manoa e principal pesquisadora do projeto (ela não está no isolamento). "A Nasa não sairá [para Marte] até resolvermos isso."

O isolamento pode causar depressão. Conflitos de personalidade podem se intensificar ao longo dos meses. "Como selecionar e apoiar astronautas para uma missão que vai durar dois a três anos de modo a mantê-los saudáveis e com bom desempenho?", disse Binsted.

Ou, como descreveu Scheibelhut: "Estou muito interessado em ver como eu reagiria. 'Não sei' é a resposta curta. Acho que pode ser de muitas formas diferentes".

Várias simulações de missões a Marte já foram realizadas nos últimos anos. Uma delas, na Rússia, durou 520 dias, em 2010 e 2011. Quatro dos seis voluntários desenvolveram distúrbios do sono e se tornaram menos produtivos ao longo do experimento.

A Sociedade Marte, organização sem fins lucrativos em prol dos voos espaciais tripulados, realiza desde 2001 simulações curtas no deserto de Utah e agora planeja uma simulação de um ano no Ártico canadense.

O Hi-Seas já abrigou duas missões de quatro meses. Em 2015, outras seis pessoas irão residir durante um ano dentro da cúpula, um edifício de dois andares e 11 metros de diâmetro, com cerca de 140 metros quadrados de área útil, erguido numa pedreira abandonada a 2.440 metros de altitude, no vulcão Mauna Loa.

Os seis membros da tripulação na cúpula do Hi-Seas ficam praticamente incomunicáveis. Seus contatos com o mundo exterior se limitam ao e-mail, e cada mensagem é retida por 20 minutos antes de ser enviada, simulando o tempo que as comunicações levam para percorrer a distância de Marte à Terra e vice-versa.

Em uma missão real, a demora muitas vezes seria menor quando a Terra e Marte se aproximassem, mas, como disse Binsted, "fomos para o pior cenário, porque estamos tentando resolver a situação do pior cenário".

Algumas exceções são concedidas aos tripulantes. Eles podem checar alguns sites, como suas contas bancárias, para garantir que as suas vidas terrenas não irão desmoronar enquanto eles estiverem fora. Há também um telefone para emergências.

Cerca de 150 pessoas se candidataram para participar. Binsted disse que os três homens e três mulheres foram escolhidos de modo a representar experiências e origens semelhantes às dos astronautas da Nasa. Alguns de fato aspiram a ir ao Espaço.

A comandante é Martha Lenio, 34, empreendedora que pretende criar uma consultoria de energias renováveis. Scheibelhut, 38, já trabalhou na primeira missão Hi-Seas como parte da equipe de apoio em terra.

Cada tripulante recebe passagem de ida e volta ao Havaí, uma bolsa US$ 11,5 mil, alimentação e hospedagem.

O objetivo é manter a coesão entre os membros da tripulação, mas isso pode resultar em problemas. "Eles se tornam mais independentes quando estão mais coesos", disse Binsted, e uma tripulação com espírito independente demais poderia ter atritos com o controle da missão.

Os pesquisadores também estarão atentos à "síndrome do terceiro trimestre". No começo da missão, a experiência é nova e interessante. Em seguida, no segundo trimestre, as pessoas caem na rotina. Perto do fim, elas podem ficar ansiosas por voltar ao mundo real.

Como astronautas reais, a tripulação do Hi-Seas se ocupa executando vários trabalhos científicos, incluindo excursões ao exterior da cúpula, vestindo trajes espaciais. "Se você vai manter as pessoas numa lata por oito meses, você quer obter delas o máximo de ciência possível.

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