quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Nova corrida espacial na Ásia pode ter consequências negativas para ciência















(Correio Braziliense) Entre 1957 e 1975, o mundo testemunhou uma das mais acirradas disputas da história. Durante quase 20 anos, Estados Unidos e União Soviética concorreram pela supremacia no cosmos, durante a chamada corrida espacial. Décadas depois, quando americanos e russos — que herdaram o programa espacial soviético após a desintegração do país comunista no fim dos anos 1980 — já se tornaram parceiros, é na Ásia que se desenvolve uma nova disputa. Índia, China, Japão e Coreia do Sul lideram o movimento, que, segundo um artigo publicado na edição de hoje da revista científica Nature, pode ter consequências negativas para a ciência.

O primeiro dos quatro países a adquirir experiência espacial respeitável foi o Japão, que, tradicionalmente, divide com a Europa o terceiro lugar na lista dos líderes espaciais. Em crescimento acelerado desde meados dos anos 1990, a China foi a primeira a desafiar a supremacia japonesa na Ásia.

Com orçamentos pomposos e metas ambiciosas, o país desenvolveu tecnologia capaz de levar seus taikonautas para fora da Terra. Por último chegou a Índia, que promete investir pesado no próximo ano para alcançar os vizinhos. Correndo por fora, com um programa menos suntuoso, mas mais objetivo, está a Coreia do Sul.

Em entrevista ao Correio, o pesquisador norte-americano James Clay Moltz, da Escola de Pós-Graduação Naval de Monterrey, nos Estados Unidos, explica que a nova corrida espacial tem duas faces. Por um lado, ela estimula o avanço científico e aumenta a presença humana no espaço. No entanto, ela também acirra as tensões já existentes na região. “Parte do problema da Ásia é que a conquista espacial está sendo influenciada pelo histórico geopolítico de rivalidades entre a China e o Japão, a Índia e a China, ou entre as Coreias”, analisa o especialista. “Mas mesmo entre os países menos desenvolvidos, como Cingapura, Vietnã e Malásia, estamos vendo a nova rivalidade no espaço”, conta.

Uma das consequências do uso de programas espaciais para demonstração de poder, assim como aconteceu com EUA e União Soviética, é o desperdício de recursos. Exemplo disso foi a retomada das missões lunares, iniciadas em 2007. “A considerável competição em ciência espacial leva à duplicação das missões. Por exemplo, houve três missões de mapeamento lunar, feitas por Japão, China e Índia. É um desperdício de recursos”, exemplifica Moltz.

Na visão do especialista norte-americano, duas nações atualmente lideram a briga asiática. “Do ponto de vista científico, o Japão é o líder atual no continente. O país possui a tecnologia mais sofisticada e se tornou pioneiro no mundo em coleta e retorno para a Terra de amostras de um asteroide”, analisa Moltz. “No entanto, do ponto de vista da tecnologia para o uso militar, quem lidera é a China, que possui muitos equipamentos, incluindo armas espaciais”, completa.

O crescimento militar espacial chinês é algo que vem tomando a atenção tanto dos competidores vizinhos quanto das nações do ocidente. “Armas espaciais da China representam uma ameaça potencial para todos os países”, conta. Além dos impactos diretos a equipamentos de outros países que orbitam ao redor do planeta. “A destruição de um dos seus próprios satélites em um teste militar chinês em janeiro de 2007 gerou mais de 3 mil peças de lixo espacial. Ser atingido por um desses pedaços é algo que precisará ser evitado por todas as naves espaciais nos próximos 50 anos”, alerta.

Brasil
Impulsionados pela disputa, os programas espaciais da Ásia representam uma possibilidade de crescimento para a tecnologia brasileira. Desde 1988, o principal parceiro do Brasil na região é a China. A cooperação sino-brasileira resultou em três satélites: os Cbers 1, 2 e 2B. “O último deixou de operar no ano passado. Eles foram muito importantes para o monitoramento da Amazônia”, conta José Monserrat Filho, chefe da Assessoria de Cooperação Internacional da Agência Espacial Brasileira (AEB). “Está tudo acertado para que, em novembro do ano que vem, seja lançado mais um satélite, o Cbers 3. A previsão é que o Cbers 4 vá para a órbita em 2014”, completa.

Embora o país já tenha desenvolvido pequenos projetos com o Japão, a cooperação ainda não conseguiu engrenar. “Brasil e Japão têm estruturas e interesses muito diferentes

Ainda não conseguimos encontrar o denominador comum”, explica Monserrat. O mesmo acontece com a Coreia do Sul, que desenvolve um programa espacial parecido com o brasileiro, focado em lançadores e satélites. “Os coreanos seriam ótimos parceiros, mas também não conseguimos estabelecer uma conexão”, afirma. Além da parceria chinesa, projetos com a Índia prometem bons frutos. “No momento, a pretensão é projetar e lançar dois satélites. O primeiro para o estudo do clima espacial, o outro de observação da Terra”, antecipa Monserrat Filho.

Menos desperdício
Em 1970 a Europa tomou a decisão de reunir seus recursos e tecnologia na Agência Espacial Europeia (ESA, na sigla em inglês), que inclui atualmente 18 países. Esse quadro de cooperação tem favorecido os esforços conjuntos e reduzido a competição e o desperdício. A estratégia também tem impedido o surgimento de tensões militares espaciais na região, garantem os especialistas.

Pequenos feitos
Apesar de não manterem o mesmo poderio de seus vizinhos, outras nações menores também colecionam feitos espaciais. Em parceria com a Rússia e os Estados Unidos, países como Vietnã, Mongólia e Malásia enviaram astronautas para o cosmos e mantêm programas para a construção de foguetes e satélites. Especula-se que a Coreia do Norte também desenvolva tecnologia militar espacial.

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